O jornal Folha de S.Paulo e o repórter Fabiano Maisonnave, que agora trabalha em uma agência de notícias internacional, foram alvos de uma decisão descabida do Tribunal de Justiça do Mato Grosso. O juiz Claudio Roberto Zeni Guimarães, da Turma Recursal do TJMT, entendeu que a matéria intitulada “41% da exploração de madeira em MT é ilegal, diz estudo”, apesar de veicular informações verdadeiras, tinha o intuito de difamar a autora da ação, Mauren Lazzaretti, que é advogada e exerceu o cargo de secretária-adjunta de Licenciamento Ambiental e Recursos Hídricos da Secretaria de Estado do Meio Ambiente de Mato Grosso (SEMA/MT).
Objeto da ação, a matéria, que foi publicada em 2018, tratava da extração ilegal de madeira, com dados levantados pelo Instituto Centro de Vida (ICV). Segundo o instituto, a responsabilidade pela ilegalidade era da SEMA/MT, da qual Lazzaretti era secretária-adjunta nomeada pela nova chefia de Carlos Fávaro, em 2016. A reportagem traz ainda o perfil da advogada, que atuava na defesa de crimes ambientais e chegou a ser presa em 2005, durante operação contra a exploração ilegal de madeira, mas foi libertada e não acusada na Justiça. A reportagem incluiu a resposta de defesa da Sema, como manda o bom jornalismo.
O TJMT afirmou que as informações eram verdadeiras, mas que o repórter, ao reunir os fatos de datas distantes, intencionava depreciar a imagem da ex-funcionária, “com o objetivo de levantar suspeitas quanto a sua lisura no exercício do cargo junto à Secretaria de Meio Ambiente Estadual”. Os réus foram responsabilizados por danos morais pela publicação da reportagem e condenados ao pagamento de indenização à autora no valor de R$ 5.000, atualizado para R$ 9.325,50. A decisão é de 15.dez.2022 e foi conhecida pela parte acusada nesta semana.
A Abraji repudia a decisão da Justiça do Mato Grosso e espera que o entendimento seja revertido pelas instâncias superiores. A Associação destaca que funcionários públicos, em razão do cargo que exercem, estão mais expostos ao escrutínio público e ao controle social das suas atividades. É importante também lembrar que, ao se tratar de determinado personagem em uma reportagem, é necessário o levantamento de sua biografia, seja ela positiva ou não. Não é a reportagem que mancha ou ilumina uma biografia, mas os atos do personagem retratado. Ademais, a matéria em nada atingiu a advogada, sendo que ela foi promovida a secretária de Meio Ambiente em seguida.
A Justiça brasileira não pode ser porta-voz de precedentes que violam os direitos fundamentais à liberdade de expressão e de imprensa, especialmente contra matérias que respeitam o direito do contraditório e veiculam fatos verídicos de interesse público. Vale ressaltar que, na semana passada, a Abraji alertou para a judicialização de críticas a reportagens no estado de Mato Grosso.
Diretoria da Abraji, 2 de fevereiro de 2023.