Precarização das contratações, flexibilização da jornada, desrespeito ao piso e retirada de outros direitos e garantias – é a “modernização” das relações trabalhistas que entra em vigor neste 11 de novembro
O Sindicato dos Jornalistas de SP produziu uma edição especial do jornal Unidade exclusivamente dedicada à reforma trabalhista (Lei 13.467/2017), que entra em vigor a partir deste 11 de novembro. A análise, elaborada com apoio do departamento jurídico da entidade, considera os impactos da nova legislação sobre a categoria a partir das especificidades da profissão.
Nesta matéria, destacamos alguns dos principais pontos que prejudicam os jornalistas e, para conferir a íntegra no Unidade Especial com as informações completas, acesse a versão digital onde é possível fazer o download e também compartilhar a publicação nas redes sociais.
Veja os principais pontos que prejudicam os jornalistas na Lei 13.467/2017:
PRECARIZAÇÃO DAS CONTRATAÇÕES
Terceirização
Com a lei do trabalho temporário e a nova lei trabalhista (13.467/2017), qualquer empresa pode terceirizar a atividade-fim. Assim, as empresas de comunicação podem contratar outras empresas para alocar jornalistas terceirizados, ou passar suas publicações para terceiras. Na prática, isso significa salários menores, com menos direitos e a possibilidade de demissões dos contratados diretos. No nosso seminário, vamos debater uma nova cláusula que proteja os jornalistas nas Convenções e Acordos Coletivos.
Trabalho intermitente O trabalhador é registrado em carteira, mas a empresa não tem obrigação de lhe passar trabalho. Caso seja convocado, aceitar e não comparecer, o jornalista tem de pagar à empresa 50% do valor combinado pelo trabalho; se comparecer e a empresa não tiver demanda, recebe metade do combinado. Os intermitentes poderão passar meses sem nenhuma remuneração, e só ganham pelas horas trabalhadas. O dispositivo aniquila o piso salarial e destrói qualquer certeza de remuneração fixa.
Home office (teletrabalho) A nova lei regulamenta o home office (teletrabalho), pelo qual o trabalhador presta seu serviço sem comparecer ao local de trabalho na maioria do tempo, e as empresas podem colocar os jornalistas já contratados para trabalhar em casa. Pela lei, estes trabalhadores não têm direito a controle de jornada (o que hoje é possível por meios eletrônicos) e não têm direito à hora extra. Permite que a empresa empurre ao jornalista os custos de infraestrutura em casa (equipamento, luz, telefone, internet etc.). São condições inaceitáveis, que pedem cláusulas de garantia a favor dos jornalistas nas convenções e acordos coletivos.
Trabalho “autônomo exclusivo” A redação inconsistente deste artigo (442-B) da nova lei expressa uma tentativa de legalizar o que hoje é fraude aberta do vínculo empregatício. Ao criar a figura do “autônomo exclusivo”, a lei diz que o trabalhador contratado desta forma não é considerado empregado da empresa, mesmo se trabalha com exclusividade ou de forma contínua. Assim, dificulta a briga pelo reconhecimento do vínculo. Mas como alguém pode ser autônomo se trabalha com exclusividade para um único empregador? E como pode ser autônomo se trabalha para o empregador de forma contínua? São questões que desafiarão a Justiça e as categorias profissionais no próximo período. Resta a subordinação como a característica mais marcante da relação com vínculo.
O PJ foi legalizado?
Não! Continuam existindo as condições que caracterizam um empregado de acordo com a CLT: habitualidade, pessoalidade e subordinação. É possível que as empresas, que já praticam a contratação de PJs usem a reforma para tentar legitimar isso. Mas a pejotização continua sendo fraude contra o vínculo empregatício e contra os direitos do jornalista.
RETIRADA DE DIREITOS E GARANTIAS
Flexibilização da jornada Até agora, a CLT determinava o respeito à jornada de trabalho – no caso dos jornalistas, 5 horas por dia, 30 horas por semana (extensíveis com mais duas horas extras contratuais). A permanência após a jornada era paga com o adicional de hora extra, salvo se houvesse acordo coletivo de compensação de horas (como na nossa convenção de Rádio e TV, em acordos em algumas empresas). Até hoje, se uma empresa de jornal ou de revista não paga a hora extra, o seu pagamento é um direito do jornalista, que pode reivindicá-lo na Justiça.
Trata-se aqui de uma questão básica: o salário que se recebe pela jornada trabalhada. E isso deixará de ser respeitado, pois a lei permite acordo individual (de forma tácita, para compensação em até 1 mês; de forma escrita, para compensação em até 6 meses). Qualquer assalariado sabe que não tem poder de impedir, individualmente, que a empresa o obrigue a assinar um acordo assim ou a trabalhar além do horário e compensar (tacitamente). No cotidiano das redações, os jornalistas poderão ser dispensados a qualquer hora do dia, passando a dever horas para a empresa; e poderão também fazer jornadas extenuantes sem ter direito a hora extra.
Essa é uma das mudanças que se choca com a Constituição. Consideramos necessário atuar para que qualquer flexibilização da jornada de trabalho esteja restrita ao quadro de negociações coletivas (que teriam de vetar “acordos individuais”), de forma a proteger os jornalistas.
Negociação individual de direitos A Lei 13.467 cria a figura do empregado “hipersuficiente”, aquele que tem curso superior e ganha salário maior do que dois tetos da Previdência Social (hoje, pouco mais de R$ 11 mil). Esse dispositivo perverso atinge diretamente uma parte de nossa categoria. O jornalista poderá ser obrigado a “negociar” individualmente, sem a força do Sindicato, questões como o reajuste anual de seu próprio salário, o vale-refeição ou o auxílio-creche! Além disso, pode ser levado a assinar um “compromisso de arbitragem”, renunciando à possibilidade de entrar com uma ação judicial posteriormente.
Redução no conceito de salário A nova lei retira a natureza salarial de verbas pagas como “ajuda de custo” e “prêmios” ao empregado. Assim, estimula o salário “por fora” – sem incidência no FGTS, férias, 13º salário etc. –, propiciando que as empresas fixem um salário baixo sobre o qual incidem direitos, e determine o resto da remuneração como verbas adicionais, sem direitos associados.
Assédio moral e sexual A reforma fixa o parâmetro salarial para estabelecer os valores de indenização por danos morais, por meio de tabelamento relativo ao salário da vítima, o que introduz diferenciações inaceitáveis. No caso hipotético em que o chefe de uma empresa assedie sexualmente duas subordinadas – uma faxineira e uma gerente –, as duas podem receber indenizações com diferenças de centenas de milhares de reais, tendo sido vítimas do mesmo crime, cometido pelo mesmo assediador. Na prática, significa dizer, na lei, que a dignidade de um(a) trabalhador(a) vale mais que a de outro(a).
Demissões coletivas Novo artigo, que já começa a exercer pressão, expressamente autoriza demissões coletivas sem negociação com sindicatos. Nos últimos anos, com base em doutrina jurídica, o SJSP conseguiu reverter demissões na Tribuna de Santos e na Rádio Estadão, bem como negociar com empresas a redução no número de dispensas ou condições menos prejudiciais aos jornalistas demitidos. Isso acaba a partir de novembro e é preciso discutir estratégias de reação contra as demissões.
Demissão por “comum acordo” A reforma trabalhista cria uma nova modalidade de demissão sem justa causa, na qual o trabalhador recebe apenas metade da multa do FGTS e do aviso-prévio, além de só sacar 80% do Fundo de Garantia e perder o direito ao seguro-desemprego. Isso abre uma nova forma de pressão contra o trabalhador, forçando acordos de demissão com redução de direitos dos jornalistas.
Fim da homologação no sindicato Atualmente, a empresa tem de homologar a demissão de um jornalista no Sindicato. Isso permite que a entidade sindical confira as contas e alerte o trabalhador sobre direitos que possam estar sendo sonegados pela empresa. Permite ainda que o Sindicato saiba das demissões em curso na categoria. O projeto prevê que a homologação seja feita na empresa, sem o Sindicato. Queremos mantê-la no Sindicato por acordo coletivo.
Intervalo intrajornada Pela nova lei, é possível instituir, por acordos coletivos, intervalos de no mínimo 30 minutos. O Sindicato dos Jornalistas reconhece a demanda de parte da categoria pela redução do intervalo de uma hora, mas alerta para o risco à saúde mental e física de uma jornada superior a seis horas sem intervalo apropriado para refeição e descanso. Este é mais um ponto sobre o qual podemos traçar estratégias em nosso seminário e em assembleias por empresa.
Férias Pela nova lei, o gozo das férias pode ser dividido em até três períodos, um deles com no mínimo 14 dias corridos, e os demais com pelo menos 5 dias. A direção do Sindicato quer escutar a avaliação da categoria a respeito. A preocupação é a de que um possível período de férias de cinco dias vire prejuízo em relação às escalas de final de ano.
Escrito por: Redação – Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo Charge: Marcio Baraldi
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